Terminou em bate-boca o depoimento do governador Ronaldo Caiado (UB), na tarde desta quinta-feira (31/5), na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga as invasões do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), na Câmara dos Deputados, em Brasília. Caiado citou ações de seu governo para evitar invasões de terra e a imediata desocupação de áreas invadidas. Mas o clima esquentou quando ele opinou sobre o MST.
Ouvido após requerimento do deputado Gustavo Gayer (PL/GO), Caiado disse que o MST tem ligação com o tráfico de drogas, que o movimento “não existe” por não ter CNPJ e ainda frisou que não há invasões de terra em Goiás.
“As pessoas que faziam tráfico de drogas se resguardavam nesses acampamentos, para levar adiante o tráfico”, declarou o governador, antes de ser interrompido por parlamentares governistas. Em outro momento, ele disse que operações da polícia em acampamentos apreenderam drogas.
Ronaldo Caiado defendeu que o colegiado apresente projeto de lei para tipificar como crime algumas condutas do movimento. Na opinião do governador, quem acampar às margens de estradas e rodovias, por exemplo, deveria perder o direito de participar de programas de reforma agrária, assim como o de receber benefícios de políticas sociais do governo.
Ronaldo Caiado também sugeriu aos deputados da CPI investigar a origem dos recursos que financiam o movimento dos sem-terra. Segundo disse, o MST não tem estatuto, nem identidade, portanto “não pode ser considerado entidade, é clandestino”. Ele sugeriu que o dinheiro que financia o movimento poderia vir do narcotráfico.
“Eu não tenho receio de governo de direita, nem governo de esquerda, nem governo de centro, eu tenho receio de governos que são controlados pelo narcotráfico. A invasão do narcotráfico nas estruturas que se apoderam e que podem se apoderar do poder. E é importante que vocês realmente possam avaliar esse nível de financiamento”, defendeu.
Em entrevista à reportagem do PORTAL NG, em Brasília, a deputada federal Magda Mofatto (PL/GO), elogiou a participação de Caiado na CPI, exaltando seu amplo histórico de defesa dos direitos dos produtores rurais.
“Ele acumulou conhecimento da história do MST, das ramificações do MST”, disse.
Para a deputada, que é integrante da CPI, o MST usa trabalhadores rurais como massa de manobra e as lideranças da entidade utilizam de invasões para forçar o governo a desapropriar terras.
“Está muito claro que esse grupo, que tem simpatia do Governo federal, só quer fazer arruaça”, acrescentou Magda.
Já o deputado Rubens Otoni (PT/GO) disse respeitar a opinião de cada um, em referência às afirmações de Caiado, mas criticou a existência da própria CPI, indicando a comissão tem essencialmente objetivo de atingir o Governo do PT.
“Essa CPI não tem nenhum sentido, é uma CPI que foi criada para criar fato político, para tentar desgastar aqui e acolá e não vai dar em nada. Quem tem opinião crítica ao MST vai continuar com sua opinião crítica; quem valoriza e reconhece o trabalho do MST, do ponto de vista da produção de alimentos, de produção orgânica, cada vez mais formando pequenos produtores para esse trabalho no campo, vai valorizá-lo cada vez mais”, avaliou Otoni em entrevista à reportagem do NG.
Para ele, investigar os movimentos sociais não está no “tema do dia”.
“Vejo que hoje o grande desafio que temos é buscar o desenvolvimento econômico, social para o nosso país. E nesse sentido, prefeituras e governos estaduais são chamados a dar sua contribuição”, acrescentou.
Bate-boca com deputado petista: ‘Não sou da sua laia’
Durante a audiência, Ronaldo Caiado e o deputado federal Paulão (PT/AL) bateram boca e, na sequência, após o atrito, o presidente da Comissão, tenente-coronel Zucco (Republicanos/RS), encerrou a sessão.
Paulão afirmou que Caiado foi “infeliz” ao declarar no começo da sessão que o MST é uma “facção criminosa”. Em seguida, o petista também disse que a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) não “tinha direito de fazer nexo causal” entre o governador e Alexandre Funari Negrão, o Xandy Negrão, ex-piloto e pecuarista que doou R$ 100 mil para a campanha de Caiado ao governo de Goiás em 2018. Negrão, que morreu na semana passada, foi indiciado na CPI do Narcotráfico em 2000 após ser flagrado fornecendo produtos químicos para o refino de cocaína, por sonegação fiscal e desacato.
Paulão citou ainda declarações do ex-senador Demóstenes Torres de que o bicheiro Carlinhos Cachoeira teria financiado campanhas do político goiano.
“Temas como esse fogem do debate da CPI, que é a questão agrária”, afirmou o deputado.
Irritado com as falas de Paulão, Ronaldo Caiado exigiu “respeito”, disse que o petista “não tem moral” para atacá-lo e o mandou calar a boca.
“Eu exijo de vossa excelência respeito. Eu nunca lhe dirigi vossa excelência de maneira desvairosa [sic]. Vossa excelência, calado, que eu estou falando agora”, ordenou Caiado.
O governador negou relações com Cachoeira e acusou Paulão de manter ligações com o bicheiro.
“Carlinhos Cachoeira é relação sua. Financiava era o PT lá de Goiás”, disse, chamando o deputado de mentiroso.
“Você aqui não tem moral para se dirigir a mim. Não entre no CPF da pessoa, você não me conhece, não sou da sua laia e não participo das suas bandalheiras”, acrescentou Caiado.
Ronaldo Caiado também defendeu Negrão e disse que “nunca” existiu “qualquer ação” contra o pecuarista.
“Ele foi chamado para fazer depoimento, mas nunca teve nenhuma condenação judicial contra ele. No meu estado ele é um empresário, que tem referência como sendo o melhor pecuarista. Nunca existiu nada que deponha contra Xandy Negrão”, destacocu.
Em meio aos gritos, o presidente da CPI tentou conter os ânimos do governador e do deputado. Sem conseguir evitar o bate-boca, Zucco determinou o fim da sessão. “Está encerrada a sessão”, afirmou.
Gleisi defende movimento social: ‘Não estamos falando de bandidos’
Durante a audiência, a deputada Gleisi Hoffmann (PT-PR) ressaltou que o MST nasceu em seu estado em 1984, para que pequenos trabalhadores rurais se organizassem, tendo em vista a construção da hidrelétrica de Itaipu, que afetou pequenos produtores.
O Brasil ainda vivia a ditadura militar e, segundo Gleisi, os trabalhadores rurais foram simplesmente expulsos das terras que ocupavam, sem nenhuma indenização, para a construção da usina. Organizaram-se, então, para tentar conseguir novamente um pedaço de terra.
Gleisi Hoffmann ressaltou que, desde sua criação, o MST já ajudou a assentar mais de 450 mil famílias, e não se pode simplesmente criminalizar o movimento. A deputada defendeu que a coexistência dos assentamentos e do agronegócio não é contraditória, e ambos devem contar com o apoio do governo.
“Eu acho que a gente tem que parar com o preconceito, nós não estamos falando de bandidos. Quando vocês falam de bandidos e criminosos aqui, vocês estão atingindo mais de 450 mil famílias que trabalham de sol a sol, sustentam seus filhos e põem comida na mesa do povo trabalhador”, disse Hoffmann.
(Com informações da Agência Câmara de Notícias)